"Eu pensava em fazer um trabalho voluntário, mas não sabia o que queria nem como começar.” A frase é da bancária Laís Helenam Bertin, 48 anos, e resume as dúvidas que afligem a maior parte das pessoas que querem começar a trilhar uma ação voluntária. A idéia de ajudar o outro costuma encantar, mas os psicólogos ressaltam que antes de se doar é preciso estar inteiro, de bem com você mesmo. Às vezes, a pessoa parte para a ajuda, mas no fundo quer mesmo é ser ajudada, diz a psicóloga clínica Maria Rita Seixas, da Universidade Federal de São Paulo. “Ela participa de trabalhos para os quais não está preparada psicologicamente. Isso pode acabar aumentando suas próprias feridas, no caso de um acontecimento não superado, e ainda atrapalhar o andamento da instituição”, diz. Por isso, antes de se inscrever numa ONG, num centro de saúde ou em qualquer lugar de voluntariado, o primeiro passo é analisar suas motivações e se preparar para uma boa dose de envolvimento. “Trabalho voluntário não é caridade. Tem que ter profissionalismo, comprometimento, vontade de trabalhar”, avisa Beloyanis Monteiro, coordenador do grupo de voluntariado da Fundação S.O.S. Mata Atlântica. O que mobiliza as pessoas a procurar por isso? “Homens e mulheres na meia-idade ou que já criaram seus filhos costumam buscar algo que dê sentido à vida e que possa de alguma maneira perpetuar seu trabalho e sua ideologia. Já o jovem tem o ideal de mudar o mundo”, responde Antonio Carlos Amador Pereira, professor de psicologia da PUC/SP.
Outro ponto importante para quem está percorrendo esse caminho é saber manter um certo distanciamento entre os problemas enfrentados nessa atividade e os seus. Isso evita que o trabalho de cooperação não se torne mais uma fonte de frustrações e tristezas. “Uma mãe que pensa que vai reviver a infância dos filhos atuando em uma creche tem que ir para a terapia e não para o voluntariado”, aponta Antonio Carlos Amador. Por outro lado, se a questão foi bem resolvida e superada, os aprendizados pessoais são valiosos. Há gente que descobre uma nova habilidade, outros ganham em troca lições de vida. Foi o caso de Rosângela Valverde, 50 anos, que é uma palhaça voluntária em um hospital. “Quando você está se doando, esquece de si mesmo. Não é fugir de seus problemas, mas descobrir uma nova forma de encará-los. Você acaba percebendo que seus dramas são muito pequenos”, acredita.
NEM SEMPRE SE ACERTA NA PRIMEIRA
A bancária Laís Helena Bertin, por exemplo, conversou com sua terapeuta antes de se dedicar a essa tarefa. Recém-aposentada, após 30 anos de um dia-a-dia agitado, ela andava um tanto desanimada com a perspectiva de passar horas em casa sem ter muito o que fazer. A psicóloga deu o aval para que Laís saísse em busca desse tipo de atividade.
Um dia, ela tomou coragem e foi ao Hospital das Clínicas de São Paulo, que fica perto de sua casa. A primeira experiência como voluntária, no entanto, não foi lá muito positiva, o que costuma ser comum – nem sempre se acerta de cara. “As pessoas têm direito de fazer o que gostam, de usar suas habilidades e o tempo disponível, mas tudo tem que bater com as necessidades da organização”, afirma Rafael Barreiro Takei, responsável pelas palestras introdutórias no Centro de Voluntariado de São Paulo.
Em seu trabalho inicial, Laís encaminhava roupas doadas para a área social do hospital. Mas não ficou satisfeita porque queria ter contato com pessoas e, antes que desistisse, pediu para mudar de setor – sim, não existe problema em dizer que não se adaptou à tarefa. Existe gente que prefere fazer o que já sabe. O contador pode ajudar nas finanças de uma ONG, por exemplo.
Hoje, Laís vai duas vezes por semana ao ambulatório do Centro de Hemofilia do Hospital das Clínicas, bate papo e ouve as histórias de quem passa pelo tratamento. Agora, está feliz da vida com sua opção. “Tento melhorar a qualidade do tempo dos pacientes que passam por lá. Faço bem para eles e eles fazem o mesmo para mim”, acredita.
Para encontrar a direção
Alguns sites, como o Voluntários (www.voluntários.com.br) e o Portal do Voluntário (www.portaldovoluntario.org.br), podem ajudar a localizar uma entidade próxima a sua casa. Outro caminho é participar das palestras realizadas pelo Centro de Voluntariado de São Paulo (www.voluntariado.org.br), onde estão cadastradas mais de 700 organizações que precisam de ajuda. Centros religiosos, hospitais, associações de bairro, empresas e clubes também costumam manter alguma ação desse tipo. Informe-se.
Quando escolher uma entidade, entre em contato e vá visitá-la. Descubra exatamente o que esperam de você e se o trabalho está dentro de suas intenções e disponibilidade. Lembre que o voluntariado exige o mesmo grau de profissionalismo que uma empresa.
O que fazer com o tempo disponível (na semana)
• 1 HORA: ajudar no planejamento de ações, contar histórias em asilos, creches e hospitais, dar palestras, atualizar o site da instituição e outras atividades de escritório.
• 2 HORAS: legalizar a situação dos moradores de rua, coletar doações, organizar materiais para uma atividade a ser desenvolvida, acompanhar doentes em exames complicados, distribuir sopa de madrugada a desabrigados, ajudar na cozinha.
• 1 MANHÃ: participar de ações em favelas, trabalhar com crianças especiais, dar aulas, organizar feiras e bazares comunitários, auxiliar deficientes visuais em suas tarefas de leitura.
• 1 DIA INTEIRO: visitar instituições no interior do estado, participar de mutirões, se envolver em atividades que exijam deslocamentos para lugares distantes.
Texto de Ana Julia Prieto
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