Observei ontem que o tril acabou. Tril é aquele composto líquido apropriado para se colocar nas casinhas que muitos gostam de pendurar nas varandas altas dos apartamentos, ou das casas, para atrair os beija-flores. São objetos plásticos ornamentais muito bonitos, coloridos, rodeados de flores de cores vivas, em cujo miolo existe um orifício de comunicação onde os pássaros se alimentam. O meu é lindo. Mas só vem atraindo, em sua maioria, pintassilgos.
Tomei da casinha ontem, pela manhã, então, para repor o líquido atraente, de tonalidade rosada. E depois de tê-lo feito, observando de dentro da minha sala a festa de um beija-flor e de uns quatro ou cinco pintassilgos em volta do recipiente cheio, de repente me ocorreu algo: esses pássaros, felizes, livres, vindos de vôos exuberantes de longa distância para saciar aqui a sua sede, parecem me visitar dentro da minha gaiola.
Sim. De súbito, dei-me conta dessa estranha realidade. Os lindos pássaros são livres, encantadores e felizes na sua liberdade, com suas necessidades todas naturalmente atendidas por Deus. No meu caso, e no de todos nós, humanos, somos, nos tempos em que vivemos, os verdadeiros prisioneiros engaiolados nos nossos apartamentos e casas - confortáveis e aconchegantes, é bem verdade. Mas presas de uma realidade nem sempre grata, que disputa espaço com o significado cálido e sagrado inerente ao recinto de um lar bem mantido: a realidade de pessoas que se abrigam em suas varandas e residências, defendidas a grades de ferro e múltiplas trancas nas portas dos perigos avultados dos tempos de insegurança em que vivemos.
Todavia, também me ocorreu durante a contemplação da felicidade das avezinhas lá fora, algo mais: outra verdade. E esta, felizmente, reconfortante.
Se somos, durante o período de nossa trajetória terrena, os verdadeiros pássaros prisioneiros de paredes e de um contexto mais ou menos inflexível de vida, que não nos permite altos vôos para além das nossas obrigações até certo ponto rígidas do cotidiano, há outras visitas de fora que nos recordam, a todo momento, e bastando para isso que para elas voltemos o suficiente a nossa atenção, de que também somos como os pássaros! Na verdade, os mais magníficos de todos! Essas visitas são oriundas das outras vastas dimensões da vida ao nosso redor, todavia, momentaneamente situadas para além da nossa percepção mais imediata.
São os nossos mentores, amigos e familiares espirituais que nos rodeiam a partir da invisibilidade. São visitas intradimensionais ou extraplanetárias que, de eras a perder de vista, sedimentaram para com cada um de nós tão estreitos quão indestrutíveis laços de amor. E, em função desse amor, nos circundam, ininterrupta e incansavelmente durante o estágio de aprendizado e de tarefas a cumprir neste restrito espaço do Universo e na estreita condição da vida corpórea.
Chegam-nos como vêm os pássaros à minha varanda pela manhã: felizes, livres! Espontaneamente! Todavia, nesse caso, o único alimento de que usufruem em tais circunstâncias é o do amor que conosco compartilham. Volitam até nós - belíssimos, rodeados de luzes e de aromas por ora insuspeitados - para nos incentivar e visitar durante nosso transitório aprisionamento no corpo terreno e na matéria que nos circunscreve a uma realidade de conotação infinitamente mais acanhada nas suas implicações. E, ternos, amorosos, nos saúdam e nos recordam:
- Um bom dia, um bom começo de outra bela manhã! Lembrem-se: não pertenceis a este lugar! Sois, também, como os pássaros que vos visitam as flores e as vossas transitórias moradias materiais terrenas! Mas, à semelhança deles, guardais a vossa origem e o vosso pouso em outros lugares! Sois, em realidade, habitantes de um Universo infinito, de paragens de claridades e de cenários neste vosso momento reclusos nos recessos das vossas reminiscências espirituais, e embotados pelos limites severos da vossa memória carnal! Sois, desde sempre, livres! E possuis, igualmente, asas! Sois mais livres do que as belas aves, das quais, por vezes, invejais o vôo soberano - porque a abrangência do vôo e da liberdade dessas criaturas simples de Deus está restrita à capacidade do que são e do que podem meramente, neste instante de sua trajetória - enquanto a vossa liberdade atende, proporcionalmente, ao alcance incomensurável que aos poucos realizais através das conquistas do vosso livre-arbítrio sobre as próprias limitações! Todavia, não há limites íntimos eternos, assim como não há limites para o vosso vôo, e para a vossa liberdade... que vós mesmos não se imponham! E a duração deste minuto no qual vos achais, assim, condicionados a circunstâncias aparentemente fortuitas e a paredes de concreto, não é nem mesmo digna de consideração se comparada às vastas extensões e vivências da Eternidade, à qual estais, desde sempre, destinados!
Assomou, sussurrada, esta mensagem sublime das outras esferas, de visitantes outros, extremamente caros à minha alma, sempre recorrentes, de tempos em tempos - enquanto mergulhava em profundo estado contemplativo, fascinada pelas criaturinhas felizes e delicadas em eufórico alarido na minha varanda, voando daqui para ali, piando, pousando, saciando a sua sede, para depois esvoaçarem para longe e, um pouco mais tarde, certamente surgirem de volta.
E assim concluo, de mim para mim, antes de também eu retornar para o meu vôo curto a outros objetivos diários, junto daqueles a quem amo e com quem compartilho as atuais vivências:
- Sim; é assim mesmo. Sou como vocês, minhas aves queridas! Sejam bem-vindas! Vocês, e também vós, outros, queridos "pássaros de Luz da eternidade"! Sejam bem-vindos! Um dia nos reuniremos todos! Para sempre!
texto de Christina Nunes - Retirado do site Somos Todos Um
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